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ACÓRDÃO Nº.000396/2020 PROCESSO Nº 1405112018-0

brasao paraiba
ESTADO DA PARAÍBA
SECRETARIA DE ESTADO DA RECEITA

PROCESSO Nº 1405112018-0
TRIBUNAL PLENO
Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULG. DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP
Recorrida: JONATHAN DE ANDRADE CAVALCANTE
Preparadora: CENTRO DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GR1 DA SEFAZ - JOÃO PESSOA
Autuante: MARIA ELIANE FERREIRA FRADE
Relator: CONS.º PAULO EDUARDO DE FIGUEIREDO CHACON

 

CONTA MERCADORIAS – SUCESSÃO DE REGIMES DE TRIBUTAÇÃO – PERÍODO SUBMETIDO AO RECOLHIMENTO DO ICMS POR MEIO DO SIMPLES NACIONAL – INAPLICABILIDADE DA TÉCNICA PARA CONTRIBUINTES DO SIMPLES NACIONAL QUE RECOLHEM O ICMS NA FORMA DO SIMPLES NACIONAL – PERÍODO SUBMETIDO AO REGIME NORMAL – VIABILIDADE – ERRO NA INDICAÇÃO DOS PERÍODOS - MANTIDA A DECISÃO RECORRIDA - AUTO DE INFRAÇÃO NULO - RECURSO DE OFÍCIO DESPROVIDO.

- A técnica de fiscalização Conta Mercadorias não é aplicável aos contribuintes do Simples Nacional, que recolhem o ICMS na forma do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06.
- No caso, comprovado que entre o período de agosto a dezembro de 2015 o contribuinte estava submetido ao regime normal de tributação, viável a utilização da técnica Conta Mercadorias para este período específico, pois o inciso II do § 2º do Art. 643 autoriza a realização de procedimento fiscal em períodos diversos do exercício fechado.

Vistos, relatados e discutidos os autos deste Processo, etc...

 

 

A C O R D A M os membros do Tribunal Pleno de Julgamento deste Conselho de Recursos Fiscais, à unanimidade e de acordo com o VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, mantendo a decisão singular que julgou nulo o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001282/2018-37 (fls. 3 e 4) lavrado em 01 de agosto de 2018 contra a empresa JONATHAN DE ANDRADE CAVALCANTE, inscrição estadual nº 16.135.197-2, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo. Em tempo, reitero a possibilidade de realização de um novo procedimento acusatório, em função do vício material indicado, desde que seja possível identificar o estoque inicial do contribuinte para que, dessa forma, fiquem delimitadas as operações sujeitas ao Simples Nacional e Regime Normal de tributação, devendo ser obedecido o prazo disciplinado no art. 173, I do Código Tributário Nacional. Ao tempo em que mantenho cancelada a quantia de R$ 1.067.439,18 (um milhão, sessenta e sete mil, quatrocentos e trinta e nove reais e dezoito centavos). Intimações a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar, que deverá observar o comando do art. 11, § 9º da Lei nº 10.094/2013, uma vez que o contribuinte está com situação cadastral suspensa desde 07/11/2019.
                               P.R.E.
                             Tribunal Pleno de Julgamento, Sessão realizada por meio de videoconferência, em 27 de outubro de 2020.
                                                            PAULO EDUARDO DE FIGUEIREDO CHACON       
                                                                            Conselheiro Relator 
                                                               LEONILSON LINS DE LUCENA
                                                                                Presidente
                         Participaram do presente julgamento os membros do Tribunal Pleno de Julgamento, JOSÉ ERIELSON ALMEIDA DO NASCIMENTO (SUPLENTE), LARISSA MENESES DE ALMEIDA (SUPLENTE), PETRÔNIO RODRIGUES LIMA, LEONARDO DO EGITO PESSOA, SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA, THAIS GUIMARÃES TEIXEIRA FONSECA E  MAÍRA CATÃO CAVALCANTI SIMÕES.

                                                                  SÉRGIO ROBERTO FÉLIX LIMA        
                                                                           Assessor Jurídico  

Por meio do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001282/2018-37 (fls. 3 e 4) lavrado em 01 de agosto de 2018 contra a empresa JONATHAN DE ANDRADE CAVALCANTE, inscrição estadual nº 16.135.197-2, a auditora fiscal responsável pelo cumprimento da Ordem de Serviço Normal nº 93300008.12.00001572/2018-30 denuncia o sujeito passivo de haver cometido a seguinte infração, ipsis litteris:

 

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS – CONTA MERCADORIAS >> Contrariando dispositivos legais, o contribuinte omitiu saídas de mercadorias tributáveis, resultando na falta de recolhimento do ICMS. Irregularidade esta detectada através do levantamento Conta Mercadorias.

 

Em decorrência deste fato, a representante fazendária, considerando haver o contribuinte infringido os artigos 158, I, 160, I c/ fulcro nos artigos 643, § 4º, II e 646, todos do RICMS/PB, lançou um crédito tributário na quantia total de R$ 1.067.439,18 (um milhão, sessenta e sete mil, quatrocentos e trinta e nove reais e dezoito centavos), sendo R$ 533.719,59 (quinhentos e trinta e três mil, setecentos e dezenove reais e cinquenta e nove centavos) de ICMS e R$ 533.719,59 (quinhentos e trinta e três mil, setecentos e dezenove reais e cinquenta e nove centavos) a título de multa por infração, com arrimo no artigo 82, V, “a”, da Lei nº 6.379/96.

Documentos instrutórios às fls. 5 a 41.

Depois de cientificada por via postal em 24 de setembro de 2018 e por edital em 4 de outubro de 2018, a autuada protocolou, em 23 de outubro de 2018, impugnação tempestiva contra os lançamentos dos créditos tributários consignados no Auto de Infração em análise (fls. 46 e 47), por meio da qual afirma, em síntese, que:

a)      Que o auto de infração é equivocado e confuso, violando o direito de defesa, uma vez que apresenta dispositivos relacionados com obrigação acessória e presunção relacionada com receita do estabelecimento;

b)      Que a arbitragem é irregular por não ter considerado a classificação fiscal dos produtos, que em sua maioria estão sujeitos à sistemática da substituição tributária;

c)      Que o auto não considerou o regime de tributação (caixa ou competência);

Com fulcro nas informações apresentadas pela defesa, a impugnante requereu a improcedência do Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001282/2018-37.

Ato contínuo, foram os autos conclusos (fls. 48) e remetidos à Gerência Executiva de Julgamento de Processos Fiscais, onde foram distribuídos ao julgador fiscal Francisco Nociti, que decidiu pela nulidade da exigência fiscal, nos termos da seguinte ementa:

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS CONTA MERCADORIAS. VÍCIO MATERIAL. NULIDADE. - Entendimento do Excelso Conselho de Recursos Fiscais é de que a denúncia de Omissão de Saídas Tributáveis – Conta Mercadorias é inaplicável aos contribuintes do Simples Nacional (Acórdão CRF-PB nº 161/2019). Entretanto, posto que o sujeito passivo encontrava-se sob Regime de Apuração Normal no curto intervalo de agosto a dezembro de 2015, a acusação relativamente a estes meses é perfeitamente factível, contanto que seja apresentado o exato período do fato gerador.

AUTO DE INFRAÇÃO NULO

Em observância ao disposto no artigo 80 da Lei nº 10.094/13, o julgador fiscal recorreu de sua decisão a esta instância ad quem.

Cientificado da decisão proferida pela instância prima em 28 de novembro de 2019, o sujeito passivo não mais se manifestou nos autos.

Remetidos ao Conselho de Recursos Fiscais, foram os autos distribuídos a esta relatoria, segundo os critérios regimentais, para apreciação e julgamento.

Eis o relatório.

VOTO

 

Em exame, o recurso de ofício interposto contra decisão de primeira instância que julgou nulo o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001282/2018-37, lavrado em 01 de agosto de 2018, contra a empresa JONATHAN DE ANDRADE CAVALCANTE, já qualificada nos autos, com exigência do crédito tributário decorrente de omissão de saídas de mercadorias tributáveis – Conta Mercadorias relativo aos exercícios de 2013 a 2017.

De forma introdutória, convém destacar que durante o período fiscalizado o contribuinte esteve submetido a dois regimes de apuração, a saber, o simples nacional (01/07/2007 a 01/08/2015), normal (01/08/2015 a 01/01/2016) e, novamente, simples nacional (01/01/2016 a 01/01/2018), conforme faz prova o extrato disponível no sistema ATF da Secretaria de Estado da Fazenda da Paraíba:

                       

Esta sucessão de regimes de apuração exigiu do zeloso julgador de primeira instância reflexão sobre a quaestio iuris de maneira fragmentada, motivo pelo qual foi reconhecida a improcedência dos lançamentos relativos aos exercícios de 2013, 2014, janeiro a julho de 2015, 2016 e 2017, bem como a nulidade do lançamento relativo ao período de agosto a dezembro de 2015.

De pronto, acompanho a decisão proferida pela instância prima, que apresentou seus fundamentos de maneira irretocável.

Nos últimos anos, o Conselho de Recursos Fiscais da Paraíba efetuou intenso debate sobre a possibilidade de utilização da técnica denominada Conta Mercadorias aos contribuintes que recolhem o ICMS na forma do Simples Nacional, apresentando, ao final, tese consensual segundo a qual esta técnica deve ser considerada inaplicável ao caso, senão veja-se os seguintes acórdãos:

 

ACÓRDÃO 161/2019

PROCESSO Nº  0876842015-3

SEGUNDA CÂMARA DE JULGAMENTO

1ª Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS GEJUP

1ª Recorrida: IVETE LOPES FERREIRA

2ª Recorrente: IVETE LOPES FERREIRA

2ª Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS GEJUP

Repartição Preparadora: UNIDADE DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA SER – ITAPORANGA

Autuante: ARMINDO GONCALVES NETO

Relator: CONS.º SIDNEY WATSON FAGUNDES DA SILVA.

OMISSÃO DE SAÍDAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS –– CONTA MERCADORIAS – INAPLICABILIDADE DA TÉCNICA PARA CONTRIBUINTES DO SIMPLES NACIONAL – IMPROCEDÊNCIA DA ACUSAÇÃO – LEVANTAMENTO FINANCEIRO – ALÍQUOTA E PENALIDADE APLICÁVEIS NOS TERMOS DA LEGISLAÇÃO A QUE ESTÃO SUBMETIDAS AS DEMAIS PESSOAS JURÍDICAS – EXCLUSÃO DO MONTANTE RELATIVO AO PREJUÍZO BRUTO COM MERCADORIAS SUJEITAS À SUBSTITUIÇÃO TRIBUTÁRIA, ISENTAS OU NÃO TRIBUTADAS APURADAS POR MEIO DA CONTA MERCADORIAS – RESTAURANTES E SIMILARES - REDUÇÃO DE BASE DE CÁLCULO RECONHECIDA – DENÚNCIA CARACTERIZADA EM PARTE – AJUSTES REALIZADOS - REFORMADA A DECISÃO RECORRIDA – AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE – RECURSO HIERÁRQUICO DESPROVIDO E RECURSO VOLUNTÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO

- A técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido não é aplicável para contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

- A ocorrência de desembolsos em valores superiores às receitas auferidas no período, constatados por meio do Levantamento Financeiro, autoriza, nos termos do artigo 646, parágrafo único do RICMS/PB, a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis sem o devido pagamento do imposto. In casu, a identificação de ocorrência de prejuízo bruto com mercadorias sujeitas à substituição tributária apurado nos levantamentos das Contas Mercadorias em todos os períodos autuados fez sucumbir parte do crédito tributário originalmente lançado.

- Imperiosa a redução da base de cálculo do ICMS, por se tratar de restaurante, conforme preconiza o artigo 34, IV, do RICMS/PB.

- Inexistência de fundamento legal para exclusão do benefício em tela, ainda que verificada a ocorrência de omissão de saídas de mercadorias tributáveis.

 

ACÓRDÃO Nº. 268/2019

PROCESSO Nº 0539582017-5

TRIBUNAL PLENO DE JULGAMENTO

1ª Recorrente: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP

1ª Recorrida: MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA

2ª Recorrente: MAGNO NASCIMENTO & CIA LTDA

2ª Recorrida: GERÊNCIA EXECUTIVA DE JULGAMENTO DE PROCESSOS FISCAIS – GEJUP

Repartição Preparadora: CENTRAL DE ATENDIMENTO AO CIDADÃO DA GER. REG. 1ªREGIÃO

Autuante(s): WADIH DE ALMEIDA SILVA

Relator: CONS.º PETRONIO RODRIGUES LIMA

Relatora do voto divergente: CONS. GÍLVIA DANTAS MACEDO

FALTA DE LANÇAMENTO DE NOTAS FISCAIS DE AQUISIÇÃO. OMISSÃO DE SAÍDAS PRETÉRITAS DE MERCADORIAS TRIBUTÁVEIS SEM PAGAMENTO DO IMPOSTO DEVIDO. DENÚNCIA CONFIGURADA EM PARTE. CONTA MERCADORIAS.  INFRAÇÃO  NÃO CARACTERIZADA. AUTO DE INFRAÇÃO PARCIALMENTE PROCEDENTE. ALTERADA DE OFÍCIO A DECISÃO RECORRIDA QUANTO AOS VALORES. RECURSOS HIERÁRQUICO E VOLUNTÁRIO DESPROVIDOS.

Em relação a contribuintes optantes pelo regime de recolhimento do imposto pelo Simples Nacional, no caso de omissões de receitas, não comporta aplicação de alíquotas inerentes a este regime de tributação, e sim àquela aplicável às demais pessoas jurídicas, na forma prevista na Lei Complementar nº 123/2006.
A falta de lançamento de notas fiscais de aquisição nos livros próprios conduz à presunção de saídas de mercadorias tributáveis sem pagamento do imposto estadual. “In casu”, as provas apresentadas pelo contribuinte foram suficientes para demonstrar a inexistência em parte de repercussão tributária, o que acarretou, “ipso facto”, o cancelamento parcial do crédito tributário relativo a esta denúncia.
A existência de CMV negativo em um determinado exercício representa uma patologia fiscal que denuncia indício tributário, onde, no entanto, o procedimento, da Conta Mercadoria não possibilita a exigência do imposto pelo simples fato de apresentar negatividade no custo mercantil das operações, fato ocorrido sobre o exercício de 2012. Portanto, mantida decisão da instância “a quo”.
Improcedência do crédito tributário apurado sobre o exercício de 2014, em relação à técnica da Conta Mercadorias – Lucro Presumido – aplicado a contribuinte do Simples Nacional, uma vez que o arbitramento de lucro bruto se evidencia incompatível e em total dissonância com o que estabelece a Lei Complementar nº 123/06. O contribuinte enquadrado como Simples Nacional possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção “juris tantum” de omissão de receitas.

 

Bebendo na fonte dos votos supracitados, elenco, de forma sucinta, os principais argumentos que foram precisamente abordados: prevalência da Lei Complementar nº 123/06 sobre o RICMS/PB; Recolhimento do tributo devido sobre o faturamento pelos contribuintes enquadrados no Simples Nacional; Impossibilidade de utilização de margem de lucro presumido para fins de aplicação da norma presuntiva de omissão de receitas[1].

Diante dos argumentos apresentados, verificamos que o cerne da questão está, para além da avaliação dos critérios de hierárquico, cronológico ou da especialidade, na fixação do sentido e do alcance da Lei Complementar nº 123/06 e do RICMS/PB, vez que a primeira foi totalmente incorporada à legislação estadual por meio do comando insculpido no art. 1º da Lei Estadual nº 8.292, de 16 de agosto de 2007:

 

Art. 1º A partir de 1º de julho de 2007, ficam incorporadas à legislação estadual as disposições relacionadas com matéria de natureza tributária constantes da Lei Complementar Federal nº 123, de 14 de dezembro de 2006, que institui o Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte.

 

De fato, a LC nº 123/06 estabeleceu normas gerais sobre o denominado Estatuto Nacional da Microempresa e da Empresa de Pequeno Porte, definindo, entre outros aspectos essenciais ao funcionamento do tratamento diferenciado, a forma de apuração de tributos, a forma de cumprimento de obrigações trabalhistas, previdenciárias, bem como o acesso ao crédito e ao mercado[2]. Esta modalidade normativa tem como função precípua a complementação da constituição e, como consequência, a apresentação de consenso legislativo que tenha duração perene (decorrente do quórum diferenciado para aprovação), motivo pelo qual possui natural incompletude sobre os temas tratados.

Assim, ao delimitar as feições gerais do referido Estatuto a norma previu participação de diversos atores[3], entre eles o Comitê Gestor do Simples Nacional - CGSN, que possui as seguintes competências:

 

§ 6º  Ao Comitê de que trata o inciso I do caput deste artigo compete regulamentar a opção, exclusão, tributação, fiscalização, arrecadação, cobrança, dívida ativa, recolhimento e demais itens relativos ao regime de que trata o art. 12 desta Lei Complementar, observadas as demais disposições desta Lei Complementar. 

 

Porém, há de ser considerado que esta moldura legal não comporta que este órgão delibere em sentido que altere a essência da sistemática diferenciada quanto à apuração e recolhimento dos impostos dos Estados, que, no caso, determina que a base de cálculo dos tributos englobados no dito regime seja a receita bruta auferida[4].

A bem da verdade, as Resoluções emitidas pelo CGSN prescrevem normas tributárias em perfeita sintonia com a LC nº 123/06, inclusive quanto à viabilidade de exigência fiscal lastreada em omissão de receitas, conforme determina o seguinte dispositivo legal:

Art. 34.  Aplicam-se à microempresa e à empresa de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional todas as presunções de omissão de receita existentes nas legislações de regência dos impostos e contribuições incluídos no Simples Nacional.

 

Vale recordar que a alínea “f” do inciso XIII do § 1º do art. 13 da LC nº 123/06 estabelece que, em sendo constatada operação ou prestação desacobertada de documento fiscal, está autorizada a aplicação da legislação do ICMS do Estado da Paraíba.

Portanto, não se está a discutir a possibilidade de aplicação de presunções de omissão de receitas para contribuintes optantes do regime tributário do Simples Nacional, mas, em específico, o arcabouço normativo contido no § 4º do Art. 643 c/c art. 646, ambos do RICMS/PB:

Art. 643. (...)

§ 4º Para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couber, os procedimentos abaixo, dentre outros, cujas repercussões são acolhidas por este Regulamento:

(...)

II - o levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

(...)

Art. 646. Autorizam a presunção de omissão de saídas de mercadorias tributáveis ou a realização de prestações de serviços tributáveis sem o recolhimento do imposto, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção:

(...)

Parágrafo único. A presunção de que cuida este artigo aplica-se, igualmente, a qualquer situação em que a soma dos desembolsos no exercício seja superior à receita do estabelecimento, levando-se em consideração os saldos inicial e final de caixa e bancos, bem como, a diferença tributável verificada no levantamento da Conta Mercadorias, quando do arbitramento do lucro bruto ou da comprovação de que houve saídas de mercadorias de estabelecimento industrial em valor inferior ao Custo dos Produtos Fabricados , quando da transferência ou venda, conforme o caso. (grifos acrescidos)

Nesse ponto, vale destacar o seguinte detalhe: os contribuintes optantes pelo Simples Nacional podem estar submetidos a dois tipos de recolhimentos, a saber, os contribuintes que recolhem o ICMS na forma do Simples Nacional e os contribuintes que recolhem o ICMS por meio do regime de tributação normal, verbi gratia, caso seja ultrapassado o sublimite para efeitos de recolhimento, conforme disposto no § 1º e 1ª-A do art. 20 da LC nº 123/06:

§ 1º A empresa de pequeno porte que ultrapassar os limites a que se referem o caput e o § 4º do art. 19 estará automaticamente impedida de recolher o ICMS e o ISS na forma do Simples Nacional, a partir do mês subsequente àquele em que tiver ocorrido o excesso, relativamente aos seus estabelecimentos localizados na unidade da Federação que os houver adotado, ressalvado o disposto nos §§ 11 e 13 do art. 3º

§ 1ª-A. Os efeitos do impedimento previsto no § 1º ocorrerão no ano-calendário subsequente se o excesso verificado não for superior a 20% (vinte por cento) dos limites referidos.

Por óbvio, estão sujeitos à técnica de fiscalização denominada Conta Mercadorias os contribuintes optantes pelo Simples Nacional que recolhem o ICMS sob o regime normal, porém, no caso dos autos, não foi comprovado que o contribuinte ultrapassou o sublimite da receita bruta adotada pelo estado[5] para o exercício de 2013.

Pois bem, diante do cenário posto, acompanho a jurisprudência do Conselho de Recursos Fiscais considerando acertada a decisão da instância prima que julgou improcedente os exercícios de 2013, 2014, janeiro a julho de 2015, 2016 e 2017.

Por sua vez, restou comprovado que entre o período de agosto a dezembro de 2015 o contribuinte estava submetido ao regime normal de tributação, ou seja, viável a utilização da técnica Conta Mercadorias para este período específico, desde que seja possível identificar o estoque inicial do contribuinte para que, dessa forma, fique delimitadas as operações sujeitas ao Simples Nacional e Regime Normal de tributação.

Assim, acompanho os termos da decisão da instância a quo, reconhecendo a nulidade por vício material do lançamento, registrando a viabilidade realização de novo procedimento fiscal, nos termos do art. 173, I do CTN.

 

Com estes fundamentos,

 

VOTO pelo recebimento do recurso de ofício, por regular, e, quanto ao mérito, pelo seu desprovimento, mantendo a decisão singular que julgou nulo o Auto de Infração de Estabelecimento nº 93300008.09.00001282/2018-37 (fls. 3 e 4) lavrado em 01 de agosto de 2018 contra a empresa JONATHAN DE ANDRADE CAVALCANTE, inscrição estadual nº 16.135.197-2, eximindo-a de quaisquer ônus decorrentes do presente processo.

Em tempo, reitero a possibilidade de realização de um novo procedimento acusatório, em função do vício material indicado, desde que seja possível identificar o estoque inicial do contribuinte para que, dessa forma, fiquem delimitadas as operações sujeitas ao Simples Nacional e Regime Normal de tributação, devendo ser obedecido o prazo disciplinado no art. 173, I do Código Tributário Nacional.

Ao tempo em que mantenho cancelada a quantia de R$ 1.067.439,18 (um milhão, sessenta e sete mil, quatrocentos e trinta e nove reais e dezoito centavos).

Intimações a cargo da repartição preparadora, na forma regulamentar, que deverá observar o comando do art. 11, § 9º da Lei nº 10.094/2013, uma vez que o contribuinte está com situação cadastral suspensa desde 07/11/2019[6].



[1] Trecho do didático Voto proferido no Acórdão 161/2019, da relatoria do Cons. Sidney Watson Fagundes da Silva:

Não obstante o fato de restar demonstrada a possibilidade de se exigir, de contribuinte enquadrado como Simples Nacional, ICMS em razão de omissão de receitas, vislumbro, no caso da primeira denúncia, uma questão de essencial relevância que prejudicou o lançamento em sua integralidade, a saber: a técnica aplicada.

Em diversos momentos, o Conselho de Recursos Fiscais do Estado da Paraíba se posicionou pela admissibilidade da Conta Mercadorias como técnica de fiscalização válida para fundamentar a denúncia de omissão de receitas. É fato.

O aprofundamento das discussões nesta Casa, aliado ao aprimoramento e ao melhor embasamento das defesas administrativas, minaram a certeza anteriormente existente e exigiram uma mudança de entendimento quanto à matéria, ao menos por parte desta relatoria.

Imperativo salientarmos mais uma vez que o que se está a discutir não é a omissão em si, mas a técnica da Conta Mercadorias para contribuinte do Simples Nacional, pelo fato de a LC nº 123/06 se mostrar incompatível com o procedimento realizado pela auditoria.

Em tempo: para os demais contribuintes, a técnica revela-se plenamente eficaz, apropriada e dotada de validade jurídica para embasar a acusação. O alcance deste entendimento é, portanto, hermético, não autorizando ampliações para situações outras.

Noutras palavras, o que se está a buscar é a compatibilização da legislação estadual com a Lei Complementar nº 123/06.

Assim como recorremos à lei especial para justificar a possibilidade de aplicação da legislação afeta às demais pessoas jurídicas para os casos de omissão de receitas, também o fazemos para sustentar a imprestabilidade da técnica utilizada (Conta Mercadorias) para dar arrimo à acusação em comento.

É cediço que a LC nº 123/06 instituiu tratamento diferenciado para os contribuintes que se amoldarem às condições nela estabelecidas e fizerem opção por este regime diferenciado. Neste norte, a partir da inclusão do contribuinte na sistemática do Simples Nacional, o regramento especial passa a produzir efeitos para o sujeito passivo, assim como para o Fisco. Não se quer dizer com isso que os demais normativos não lhe sejam aplicáveis. O que se afirma é que se deve observar se a norma se harmoniza com a LC nº 123/06.

Posto de outra forma - e já adentrando no caso concreto -, para que se possa validar o procedimento fiscal que resultou na identificação de omissão de receitas, faz-se mister analisarmos se os procedimentos da Conta Mercadorias são compatíveis com o regramento especial.

Já destacamos alhures que a jurisprudência desta Corte respondera afirmativamente; todavia, esmiuçando a questão sob o prisma eminentemente jurídico, entendo necessária a reforma deste posicionamento.

O RICMS/PB, em seu artigo 643, §§ 3º e § 4º, disciplina que, no exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular devidamente registrada na Junta Comercial, para efeito de aferição da regularidade das operações quanto ao recolhimento do imposto, deverão ser utilizados, onde couberem, os seguintes procedimentos:

a)      Elaboração de Demonstrativo Financeiro, através do qual deverão ser evidenciadas todas as receitas e despesas, bem como a disponibilidade financeira existente em Caixa e Bancos, devidamente comprovada, no início e no final do período fiscalizado;

b)      Levantamento da Conta Mercadorias, caso em que o montante das vendas deverá ser equivalente ao custo das mercadorias vendidas (CMV) acrescido de valor nunca inferior a 30% (trinta por cento) para qualquer tipo de atividade, observado o disposto no inciso III do parágrafo único do art. 24.

Ao dispor acerca deste último procedimento, o RICMS/PB, ao estabelecer percentual (30%) a ser acrescido ao Custo de Mercadorias Vendidas, mostra-se claramente em dissonância com a sistemática estabelecida pela LC nº 123/06.

Importante destacarmos que o RICMS/PB é anterior à LC nº 123/06. Também convém salientarmos que, além de hierarquicamente superior àquele, esta última dispõe sobre matéria de conteúdo especial.

Destarte, sob qualquer princípio que se analise (hierárquico, cronológico ou da especialidade), deve prevalecer a LC nº 123/06, afastando-se o RICMS/PB, naquilo que se mostrar incompatível com a Lei Complementar.

O contribuinte enquadrado como Simples Nacional recolhe o tributo devido sobre o seu faturamento, em observância ao que estabelece o artigo 18, § 3º, da LC nº 123/06:

(...)
Destarte, o contribuinte que apura e recolhe o tributo com base nos dispositivos acima reproduzidos, estará em situação regular quanto à obrigação principal à luz da LC nº 123/06.

A cobrança de tributos, por força do que estabelece o artigo 3º do Código Tributário Nacional, é uma atividade administrativa vinculada, não sendo possível ao auditor fiscal agir de forma discricionária.

Esta ressalva se faz necessária para explicar que, no caso em comento, não estamos afastando a aplicabilidade do artigo 643, § 4º, do RICMS/PB, tampouco deixando ao talante da autoridade fiscal a possibilidade de “escolher” quando utilizá-la. Uma análise mais atenta do dispositivo citado nos permite concluir que a solução para a questão extrai-se do § 4º do referido artigo. Vejamos:

(...)
Partindo do princípio de que a lei não contém palavras inúteis, a expressão “onde couber” indica que os procedimentos previstos nos inciso I e II do § 4º do artigo 643 do RICMS/PB não são obrigatórios para todo e qualquer exame da escrita fiscal de contribuinte que não mantenha escrituração contábil regular.

Este comando, portanto, não é taxativo e não vincula o auditor fiscal a adotá-los em todas as situações, mas somente nos casos em que “couberem”.

O contribuinte enquadrado como Simples Nacional, como já demonstrado, possui características e regramento próprios, o que o coloca em situação especial, não permitindo a utilização de margem de lucro presumido para fins de surgimento da presunção juris tantum de omissão de receitas.

Na LC nº 123/06, não há qualquer exigência neste sentido para fins de tributação. Apenas no inciso X do seu artigo 29 consta uma referência ao lucro bruto – ainda que de forma indireta -, contudo para efeito de exclusão do regime.

(...) 
Somente depois de excluído do Simples Nacional, o Fisco está autorizado a lançar mão da Conta Mercadorias – Lucro Presumido para aqueles que não detenham escrita contábil, o que não implica dizer que o contribuinte, enquanto enquadrado na sistemática da LC nº 123/06, esteja “blindado”. A fiscalização tem o poder-dever de verificar a regularidade das operações do contribuinte, utilizando-se, para tanto, dos demais recursos de que dispõe para cumprir o seu mister.



[2] Art. Art. 1o  Esta Lei Complementar estabelece normas gerais relativas ao tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, especialmente no que se refere:

I - à apuração e recolhimento dos impostos e contribuições da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, mediante regime único de arrecadação, inclusive obrigações acessórias;

II - ao cumprimento de obrigações trabalhistas e previdenciárias, inclusive obrigações acessórias;

III - ao acesso a crédito e ao mercado, inclusive quanto à preferência nas aquisições de bens e serviços pelos Poderes Públicos, à tecnologia, ao associativismo e às regras de inclusão. 

IV - ao cadastro nacional único de contribuintes a que se refere o inciso IV do parágrafo único do art. 146, in fine, da Constituição Federal.



[3] Art. 2o  O tratamento diferenciado e favorecido a ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte de que trata o art. 1o desta Lei Complementar será gerido pelas instâncias a seguir especificadas:

I - Comitê Gestor do Simples Nacional, vinculado ao Ministério da Fazenda, composto por 4 (quatro) representantes da Secretaria da Receita Federal do Brasil, como  representantes da União, 2 (dois) dos Estados e do Distrito Federal e 2 (dois) dos Municípios, para tratar dos aspectos tributários; e

II - Fórum Permanente das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte, com a participação dos órgãos federais competentes e das entidades vinculadas ao setor, para tratar dos demais aspectos, ressalvado o disposto no inciso III do caput deste artigo;

III - Comitê para Gestão da Rede Nacional para Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios - CGSIM, vinculado à Secretaria da Micro e Pequena Empresa da Presidência da República, composto por representantes da União, dos Estados e do Distrito Federal, dos Municípios e demais órgãos de apoio e de registro empresarial, na forma definida pelo Poder Executivo, para tratar do processo de registro e de legalização de empresários e de pessoas jurídicas.       

 



[4] Art. 18.  O valor devido mensalmente pela microempresa ou empresa de pequeno porte optante pelo Simples Nacional será determinado mediante aplicação das alíquotas efetivas, calculadas a partir das alíquotas nominais constantes das tabelas dos Anexos I a V desta Lei Complementar, sobre a base de cálculo de que trata o § 3o deste artigo, observado o disposto no § 15 do art. 3o. 

(...)

§ 3o  Sobre a receita bruta auferida no mês incidirá a alíquota efetiva determinada na forma do caput e dos §§ 1o, 1o-A e 2o deste artigo, podendo tal incidência se dar, à opção do contribuinte, na forma regulamentada pelo Comitê Gestor, sobre a receita recebida no mês, sendo essa opção irretratável para todo o ano-calendário. (grifos acrescidos)



[5] Sublimite para o exercício de 2013 - R$ 2.520.000,00 (dois milhões, quinhentos e vinte mil reais).



[6] § 9º Para efeitos do disposto no inciso II do “caput” deste artigo, a intimação, quando o sujeito passivo não estiver com sua inscrição ativa perante o Cadastro de Contribuintes do ICMS do Estado, deverá ser realizada:

I - no endereço do sócio administrador da empresa;

II - no endereço do representante legal constante no Cadastro de Contribuintes do ICMS, caso a pessoa jurídica não tenha sócio administrador;

III - por edital, publicado no Diário Oficial Eletrônico - DOe-SER, no caso de devolução do Aviso de Recebimento (AR) sem lograr êxito na entrega da intimação, nos termos dos incisos I e II deste parágrafo.

Informação constante no Sistema ATF da Secretaria de Estado da Fazenda:

 



 

 

Tribunal Pleno, sessão realizada por meio de videoconferência, em 27 de outubro de 2020.

 

 

                                                                                                        Paulo Eduardo de Figueiredo Chacon
                                                                                                                     Conselheiro Relator 

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